A colaboração entre os Tribunais de Contas e o controle social é tema do último módulo do Educontas Notícias

18/10/2021 11:30

O quarto módulo do XII Encontro Técnico de Educação Profissional dos Tribunais de Contas do Brasil (Educontas) discutiu assuntos ligados à Educação, democracia na aprendizagem e a colaboração entre as Cortes de Contas e o controle social. E para mediar o encontro online, que ocorreu na manhã de sexta-feira (15/10), foi designado o técnico do Tribunal de Contas do Rio Grande do Sul (TCE-RS), Ricardo Collar. Além dele, participaram como debatedores os professores César Nunes e Daniel Cara.

O professor César Nunes participou do evento diretamente de Coimbra - Portugal. Importante formulador na área de Educação Pública, ele é professor titular de Filosofia e Educação na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), professor visitante no curso de pós-graduação em Direitos Humanos da Universidade de Coimbra e diretor do Instituto de Pesquisas de Direitos Humanos de Campinas.

Nunes iniciou sua apresentação fazendo breve histórico sobre a origem da escola, que surgiu na Grécia cinco séculos antes de cristo. Citou aspectos da colonização do Brasil por Portugal e a sua influência na evolução da Educação em nosso país. Segundo ele, a Educação serviu ao interesse colonial português, manteve o estigma escravocrata no Império e foi privilégio de classe desde o primeiro momento de nossa constituição estatal. “Na República e na industrialização a educação se transformou em uma serva. Servil produtora de mão de obra para o sistema capitalista retardado, anacrônico que aqui se estabelecia”, asseverou.

O professor salientou que, da constituição de 1988 para cá, a luta é para consolidar efetivamente um sistema nacional, universal, público, gratuito, estatal, financiado como direito basilar da cidadania cultural. “Pois até 1968, no Brasil, a escola é um dos maiores símbolos do Apartheid social, aquele regime sul-africano que era racial. No Brasil, ele é social. Escola para pobre funciona de um jeito e para classe média e para o rico funciona de outro”, destacou.

Nunes afirmou que temos duas propostas políticas e pedagógicas abertas. A primeira seria a pedagogia das competências e habilidades. Pedagogia altamente neoliberal, que se fundamenta na bonificação para professores, nos resultados e no modelo avaliativista em larga escala. O avaliativismo, a meritocracia, a competição e os ideais estatísticos que sustentariam o conceito de qualidade educacional. Segundo ele, “as pedagogias das competências colonizaram todas as redes estaduais e municipais do Brasil e ainda hoje regem a Educação brasileira”.

“Por outro lado, fizemos na década passada uma proposta educacional que pode se transformar em uma política educacional: direito a estar na escola e direito a aprender na escola. Oposta à pedagogia das competências e habilidades”, informou Nunes. “O dieito a estar na escola supõe financiamento da educação, estruturação da organização das escolas e do trabalho pedagógico, piso nacional salarial, diretrizes curriculares e uma paciência histórica para implementar essas novas diretrizes”, defendeu.

Nunes concluiu a apresentação afirmando que “a escola brasileira nascerá das cinzas da escola do próprio passado, como uma Fênix a se transformar numa escola de direitos de aprendizagem, direitos de convivência e direitos de humanização. Essa é a escola em que eu acredito. E que as Escolas de Contas deveriam ter como paradigma na análise e ter como paradigma na defesa”.

A exposição seguinte foi feita pelo educador e cientista político Daniel Cara. Ele é professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), doutor em Educacão e mestre em Ciências Políticas pela mesma universidade, além de membro do Comitê Diretivo da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, rede da sociedade civil que coordenou de 2006 a 2020.

Daniel Cara acredita que para fazer o controle social sobre as políticas educacionais, os Tribunais de Contas precisam ter uma compreensão muito clara de que não dá para entender as avaliações de larga escala como sinônimos de qualidade em Educação.

Ele afirmou, ainda, que os Tribunais de Contas, para fazer um bom controle social, devem ir além da avaliação de larga escala, além dos instrumentos tradicionais de avaliação da política educacional, tais como fluxo, ingresso, matrícula, exclusão escolar. Têm que considerar as condições como se dá a oferta da Educação e o direito a ela. “Vai ter que considerar, por exemplo, dados de ordem sanitária, dados de ordem de segurança pública, dados de ordem de saúde pública, vai ter que considerar questões relativas à assistência social, vai ter que considerar as condições de trabalho na escola”, defendeu.

Segundo Daniel Cara, para constituir o controle social, os Tribunais de Contas precisam ter a ousadia, já que está na Constituição, de colaborar na luta pela regulamentação dessas matérias, para que o debate sobre qualidade da Educação não fique tão empobrecido, como a falácia que recurso não importa para a qualidade da Educação. “Financiamento é parte integrante da gestão, tanto que os Tribunais de Contas lutam todo ano pra saber se os estados e municípios cumpriram o investimento mínimo estabelecido na Constituição Estadual e na Lei Orgânica dos municípios”, afirmou.

Por fim, o especialista destacou que boa parte dos problemas podem ser resolvidos se algo acontecer no Brasil. Algo que, segundo ele, nunca aconteceu em nossa história. “O Brasil é o único país com mais de cem milhões de habitantes que nunca teve uma ministra ou ministro da Educação que de fato tivesse trabalhado numa escola de educação básica. Nunca teve também uma ministra ou ministro da Educação que tivesse uma formação pedagógica ou nas demais licenciaturas, ou seja, somos um país que ignora a importância das ciências pedagógicas e da Filosofia da Educação”, concluiu Daniel Cara.

Ao final das apresentações, os participantes responderam as perguntas formuladas pelas pessoas que acompanharam o evento em tempo real.

Confira a íntegra do módulo 4: